quinta-feira, 27 de março de 2014

Genro de Bin Laden é condenado nos EUA: Sulaiman Abu Ghaith é considerado culpado de conspirar para matar americanos; pena será definida em setembro

Com duração de três semanas, julgamento foi o mais importante de terrorismo já feito em solo americano
ISABEL FLECKDE NOVA YORK
Nas últimas três semanas, a cena foi recorrente na corte federal de Manhattan: olhos grudados na tela à sua frente, Sulaiman Abu Ghaith, genro de Osama bin Laden e apontado como porta-voz da Al Qaeda, acompanha a exibição de vídeos em que faz discursos inflamados logo após os ataques do 11 de Setembro.
Num deles, ameaça os EUA com uma "tempestade de aviões".
As gravações --repetidas à exaustão durante o julgamento-- foram as principais provas usadas pela promotoria para conseguir a condenação de Abu Ghaith, 48, no crime de conspirar para matar americanos. A decisão foi anunciada ontem pelo júri.
A sentença, que pode chegar à prisão perpétua, será definida em 8 de setembro.
Diferente de sua versão 12 anos mais jovem, com barba ainda escura e turbante, o Abu Ghaith réu, de terno, careca e com longa barba grisalha, assistiu aos vídeos e aos depoimentos com ar resignado, sem esboçar reação.
Da janela da sala onde ele foi julgado, no 26º andar do prédio da corte federal em Manhattan, era possível avistar, a poucas quadras, o local antes ocupado pelas duas torres do World Trade Center.
Entre o reduzido público que acompanhou o julgamento --formado especialmente por jornalistas e estudantes de direito--, também se revezavam parentes de vítimas do 11 de Setembro.
"A decisão de comparecer foi difícil. Mas, além de os ataques terem me afetado diretamente, queria entender melhor como tudo isso funciona, para que mais vidas não sejam perdidas", disse a antropóloga Ellen Judd, que perdeu a companheira, Christine Egan, e o cunhado, Michael.
O forte simbolismo do local serviu para reforçar a tese do advogado de defesa, Stanley Cohen: seu cliente estava ali para responder por Bin Laden, morto em 2011.
Para ele, o mais importante julgamento de terrorismo realizado em solo americano após 2001 se tornou o julgamento que os EUA nunca poderão ter. "O governo americano está querendo julgar Bin Laden. Mas Sulaiman Abu Ghaith não é Bin Laden" disse Cohen àFolha.
O julgamento foi numa corte civil, como defende o presidente Barack Obama.
Abu Ghaith, casado com Fatima, filha de Bin Laden, não foi acusado de ligação com os ataques às Torres Gêmeas. Sua atuação teria vindo depois, com vídeos que, segundo a acusação, serviram para o recrutamento de terroristas dispostos a participar de novos ataques.
O próprio Abu Ghaith, que, numa inesperada manobra da defesa, testemunhou na semana passada, admitiu que Bin Laden, na noite após os ataques, teria pedido sua ajuda para "enviar uma mensagem ao mundo".
Abu Ghaith, contou que, na noite de 11 de setembro de 2001, se reuniu com Bin Laden em uma caverna nas montanhas. "Ele me disse: Você soube o que aconteceu? Nós que fizemos isso'", disse o réu, frisando que não sabia do atentado antes.
Nascido no Kuait, o imã chegou ao Afeganistão em 2000, onde conheceu Bin Laden e a Al Qaeda, e ficou lá até 2002, quando foi para o Irã. Ele foi detido em 2013, na Jordânia, quando era extraditado da Turquia para o Kuait, e levado aos EUA.
Segundo o homem apontado como mentor dos ataques do 11 de Setembro, Khalid Sheikh Mohammed, Ghaith foi escolhido pelo líder da rede terrorista como seu mensageiro por ser um "orador eloquente", e não porque soubesse das ações terroristas planejadas.
Entretanto, o depoimento de Mohammed inocentando Abu Ghaith --enviado, por carta, de Guantánamo, onde ele está preso com vários outros suspeitos de terrorismo"" não teve seu uso pela defesa autorizado pelo juiz.
Durante as três semanas de julgamento, testemunharam agentes americanos, um homem que foi recrutado pela Al Qaeda e especialistas em terrorismo, que colocaram Abu Ghaith como um importante membro da rede por comandar a sua "propaganda".
Os integrantes do júri --nove mulheres e três homens-- haviam declarado, antes do julgamento, não só nunca ter ouvido falar em Abu Ghaith, como não consideravam que a sua relação com Bin Laden os tornaria parciais. A condenação foi um voto unânime.
Folha, 26.03.2014.
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